Afinação Pitagórica, Natural e as Afinações Temperadas

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A afinação Pitagórica, bem como os sistemas temperamentos adotados posteriormente, foram tentativas de se estabelecer algum parâmetro para se adaptar as notas musicais a uma estética que se aproxime das proporções matemáticamente perfeitas.

Antes de nos aprofundarmos nas questões de estrutura de cada modelo de afinação, porém, faz-se necessário explicar os fundamentos das afinações musicais.

As notas musicais que usamos cotidianamente nem sempre foram convenções estabelecidas. Na verdade, em boa parte da história, a idéia de notas musicais era um tanto quanto abstrata e volátil, pois não havia um consenso a respeito do sistemas de afinação mais adequado para a música praticada ao longo dos séculos.

O uso do nome das notas musicais foi concebido pelo Monge italiano Guido de Arezzo no século XI que, por ter criado as bases do sistema de notação musical moderno, precisava estabelecer unidades sonoras reconhecíveis. Entretanto, anteriormente já tínhamos registros teóricos das várias tentativas de se estabelecer sistemas de afinação baseando-se apenas nas proporções sonoras a partir de uma frequência referencial.

O Problema Fundamental dos Sistemas de Afinação

O fato de não haver uma convenção única de afinação durante tanto tempo se deu por uma inadequação dos padrões existentes à proporção perfeita entre notas.

A percepção das proporções sonoras é inata. Não se sabe muito bem ao certo, mas conseguimos identificar muito bem proporções entre frequências. Dessa forma, chamamos de consonâncias, as proporções mais simples como uníssonos (1/1), oitavas (2/1) e quintas (3/2). Esses intervalos são os mais importantes para a construção de qualquer sitema de afinação nos moldes acidentais.

O problema em se construir um sistema de afinação ideal, é que as frequências não seriam precisas, visto que, esse sistema de afinação baseia-se exclusivamente na comparação entre frequências sonoras. Desse modo, esse modelo de afinação é impraticável em instrumentos com notas fixas, como o piano, cravo e instrumentos de corda com trastes, pois as frequências tendem a variar em comas a depender da proporção intervalar entre elas. Esse problema é sintetizado no paradoxo das quintas e terças.

O paradoxo das quintas e terças reside-se no fato de que não há como estabelecer frequências fixas em torno de intervalos puros.

Para explicar esse conceito, tomemos a nota Lá 440 Hz como exemplo.

Sabendo que a proporção simples de uma oitava é 2×1, a proporção de um intervalo de quinta é 3×2 e a proporção de uma terça maior pura é de 5×4:

Na tentativa de se corrigir o paradoxo das terças e quintas, desenvolvou-se o sistemas de afinação como a afinação pitagórica
Embora nas duas situações há o salto de 14 tons, há uma significante diferença entre as frequências das duas notas Dó#.

Coma Pitagórica é a diferença de frequência encontrada entre as freuências observadas a depender da comparação intervalar
A diferença de frequências entre alturas que, em tese, representariam a mesma nota é chamada de Coma Sintônica.

Afinação Justa

O sistema de afinação Justo é o mais perfeito do ponto de vista estético. Trata-se de um modelo baseado unicamente em intervalos puros que, apesar das limitações impostas pela subjetividade da comparação de intervalos, foi muito usado no canto.

A Afinação pitagórica visa maior praticidade em relação à afinação justa

Os problemas advindos dessa escolha são decorrentes do paradoxo das terças e quintas, mas não só isso.

Alguns dos problemas desse tipo de afinação são:

  • Se usarmos somente intervalos perfeitos em polifonias, em algum momento, invariavelmente, a música sairá da tonalidade inicial.
  • Intervalos melódicos são comprometidos, visto que, cada nota individualmente formara intervalos com frequências distintas adequadas à sua altura.

Não por acaso, esse sistema de afinação logo se tornou inviável a partir do momento em que se consolidou o uso de instrumentos musicais com notas fixas. Sendo assim, a partir da das descobertas da série harmônica, Pitágoras criou o sistema de Afinação que recebe seu nome.

Série Harmônica e a Afinação Pitagórica

O primeiro grande estudioso da física envolvida na percepção sonora de
que se tem notícia foi Pitágoras, um matemático e filósofo pré-socrático grego que fundamentou o estudo da matemática envolvida nas manifestações da natureza.
Pitágoras percebeu que uma corda colocada em vibração produzia ondas não só em sua extensão total, mas também em frações dela:

Série Harmônica

A partir dessas observações, Pitágoras construiu um instrumento de uma corda chamado de monocórdio. Ao dividir a corda em frações proporcionais, Pitágoras percebeu um padrão interessante. Quanto menor for o comprimento da corda, maior seria a frequência produzida por ela de forma que, ao se dividir a corda em duas partes, obteria o dobro da frequência, dividindo-a em três partes, obteríamos o triplo e assim por diante.

Nesse experimento, Pitágoras pode constatar que a vibração que se extende por toda corda forma a vibração principal, em outras palavras, é a nota mais clara de se perceber. Consequentemente, as ondas formadas a partir das frações da corda formam ondas secundárias que juntamente com a onda principal, criam o corpo da nota. Nesse momento, ele descobrira a Série Harmônica.

A onda formada pela vibração da extensão total da corda é a onda principal. As ondas formadas pela vibração das frações da corda são os harmônicos secundários. Tecnicamente, a onda principal também é um harmônico, mas deixemos essa discussão para outro post.

A partir de suas descobertas, Pitágoras criou um sistema de afinação que carrega seu nome, O Sistema de Afinação Pitagórico.

Afinação Pitagórica

A afinação pitagórica organiza a escala de notas baseando-se nas frequências da vibração principal de uma determinada nota, e sobre ela, sobrepõe-se intervalos de quinta justa.

Dessa forma, a escala pitagórica é construída a partir da sobreposição de intervalos de quinta justa, ou seja, a multiplicação da prequência por 1,5.

Dessa forma, construiu-se um sistema de afinação que não era pensado de forma cíclica. Esse sistema de afinação, entretanto, atendia bem às necessidades dos instrumentos medievais que não eram concebidos para o sistema de escala de doze notas.

Problemas da Escala Pitagórica

Na medida em que a música europeia evoluiu, o número de notas usadas foi ampliado de forma a resultar na atual escalas de 12 notas. Esse sistema possivelmente surgiu a partir do alargamento das notas do sistema pitagórico de afinação, isso porque na 12ª sobreposição de intervalo de quinta, obtém-se uma nota muito próxima de uma oitava da altura inicial, conforme a figura abaixo:

Ciclo das quintas na afinação pitagórica
Em vermelho, temos o último intervalo de 5ª que, em tese, deveria fechar o ciclo. Entretanto, esse intervalo soa desafinado em relação aos demais. Chamamos esse último intervalo de quinta do lobo.

Outro problema do sistema de afinação pitagórico foi a diferença existente entre a terça pura e a terça pitagórica que é bem mais alta, soando muito desafinada. Vale lembrar que o uso de intervalos de terça nessa época não era comum, por isso, essa desafinação era desconsiderada.

Temperamentos

Por volta de 1691 o organista, compositor e teorista musical Andreas Werckmeister fundamentou um sistema de afinação que dividia a escala em doze partes proporcionais. Esse novo sistema de escalas firmava a divisão semitonal em quatro comas e meio, permitindo a transposição de qualquer música sob esse sistema de afinação a qualquer um dos doze tons da escala cromática 2.

Para consolidar esse invento, Johann Sebastian Bach compôs, no século
XVIII, O Cravo Bem Temperado, uma coleção que inicialmente contava com
vinte e quatro músicas, doze em tons maiores e doze em menores que se
utilizavam de afinação temperada.

O campo de estudo dos fenômenos sonoros é vasto e, para os músicos que desejam ingressar na produção musical, é matéria obrigatória pois se trata da matéria prima mais elementar de qualquer arranjo musical. Neste post, entretanto, há apenas uma introdução ao assunto.

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